De que forma a pandemia e o teletrabalho alteraram o relacionamento entre as empresas e os seus Clientes?
Bem, esta pergunta só por si daria para escrever uma verdadeira enciclopédia. Para simplificar diria que, numa primeira fase, empresas e clientes se aproximaram num movimento “estamos todos no mesmo barco”. As pessoas ficaram muito mais compreensivas até na sua relação com as empresas perante a dificuldade de entrega a que estavam habituados, porque todos foram colocadas em situações que não eram habituais e, portanto, acabaram por compreender que as próprias empresas tivessem tido alguma dificuldade no início, a adaptar-se a esta nova realidade do teletrabalho. No entanto, com o passar do tempo e à medida que muitas empresas mantinham a dificuldade em adaptarse aos novos tempos, a tolerância dos consumidores foi diminuindo. Diria que alguns meses após o início da pandemia, e hoje em dia, a exigência está ao nível do que era antigamente e muitas empresas continuam a não ter toda a capacidade de resposta a que os seus clientes estavam habituados. O que temos hoje em dia é uma sociedade ainda mais dependente da tecnologia, muito menos dependente do presencial - algo que pelo menos em parte se vai manter. E, portanto, a relação das pessoas com as suas empresas é muito mais tecnológica do que era. Nesse sentido é uma relação que implica cada vez mais respostas imediatas e claras. As pessoas não querem perder muito tempo a fazer aquilo que podem fazer com dois ou três cliques no telemóvel e as empresas têm que dar resposta a essa exigência.
As reuniões por plataformas informáticas, em detrimento das reuniões presenciais, vieram para ficar?
Parcialmente. Acredito que muitas reuniões vão passar a existir apenas em formato remoto - por exemplo reuniões que antigamente obrigavam a deslocações de avião ou por exemplo no caso português, as muito concorridas viagens Lisboa/Porto. Muitas destas deixarão de se fazer da mesma forma porque todos percebemos que há reuniões que se conseguem substituir por uma videoconferência. Mesmo que não tenham exatamente os mesmos resultados, os ganhos que se conseguem a nível de tempo e custos, compensam alguma eventual perda de eficácia. No entanto, a componente humana vai continuar a ser importante. Não é por acaso que hoje em dia muitos de nós ansiamos por retomar, por exemplo, os almoços de trabalho. Para conhecer um cliente novo ou em momentos importantes para as empresas, o presencial vai voltar a ser dominante. Momentos de networking, como as conferências setoriais, formação de executivos, entre outras, voltarão pelo menos em parte a ser presenciais, porque o networking é completamente diferente, presencialmente. O presencial continua a ser apesar de tudo o método preferencial de contato com as pessoas e para fazer com que a nossa mensagem passe.
O teletrabalho será o futuro?
Para muitas empresas e profissionais o teletrabalho será o futuro e para muitos outros o modelo anterior vai regressar. Ainda não é possível cortar o cabelo virtualmente, por exemplo. No entanto, acredito que em boa parte das situações o teletrabalho vai pelo menos ser adotado parcialmente. Tem inúmeras vantagens quer para os trabalhadores quer para as empresas. No fundo permite de alguma forma racionalizar o uso das instalações das empresas, reduzindo custos que as empresas têm com o aluguer/aquisição e gestão dessas instalações. Para os trabalhadores há ganhos a nível de tempo e de liberdade de usufruto da sua vida pessoal, algo que a ida para o escritório compromete. Teremos um equilíbrio que não existia anteriormente entre a vida profissional e a pessoal feito caso a caso, empresa a empresa, indústria a indústria.
Como podem as empresas manter o controlo operativo e de qualidade estando os seus Colaboradores em teletrabalho?
Existem ramos de atividade em que o controle tem que ser feito pessoalmente. Mas na maior parte dos casos, isso não é necessário. Todo o trabalho que é feito na área dos serviços de forma remota, também consegue ser controlado remotamente. Se é possível fazer o trabalho em casa e o resultado depois é disponibilizado de alguma forma, então também é perfeitamente possível controlar a qualidade desse trabalho de forma remota. Em algumas situações é preciso alguma criatividade e em muitas outras é necessário quebrar com rotinas de trabalho enraizadas na pré-pandemia e que nunca voltarão tal como eram.
Como manter e promover o espírito de equipa e a integração nos valores da empresa, estando os colaboradores em teletrabalho?
Bem, há aqui um primeiro desafio que tem a ver com a integração dos colaboradores. O momento da integração dos colaboradores tem vindo a ser profundamente alterado pelo teletrabalho. Se estamos a falar de um trabalhador que já está na empresa há algum tempo, o teletrabalho acaba por não me ter um impacto muito significativo na questão da ligação à empresa porque essa cultura da empresa já existe e a ligação a colegas, chefias, etc. também. Quando estamos a falar de um colaborador que acabou de entrar na empresa e é imediatamente colocado em teletrabalho, há aqui de facto uma quebra no conhecimento da cultura da empresa e suas práticas que é mais difícil de compensar. Aqueles pequenos momentos na relação uns com os outros e aquela comunicação mais informal que existe presencialmente não se reproduz através do Zoom. Para minorar este impacto, diria que o primeiro a fazer é ter imensa atenção na integração inicial dos colaboradores na empresa, sendo transformados completamente através do envolvimento do maior número possível de pessoas nesse processo, incluindo as pessoas ao mais alto nível na organização. A cultura da empresa e a sua visão e missão serão melhor transmitidos pela Administração do que pelo colega do lado. Acrescentaria também o reforço de algum tipo de mentoria, que não deve ser pelo chefe direto (apenas). É completamente diferente ser o chefe a fazer o acompanhamento de uma pessoa que entra, do que ser um colega de trabalho mais experiente. Ou ser uma pessoa mais sénior na empresa, que até pode estar noutra área completamente diferente, mas que vai ter uma dedicação especial no enquadramento deste colaborador. Aqui é fundamental ter alguém que verdadeiramente vista a camisola da Empresa, mas saiba também ser pedagógico e crie empatia com o novo colaborador. Para todos os restantes colaboradores - até porque há o risco de esta ligação com a empresa se ir desvanecendo com o tempo se o teletrabalho passar a ser uma realidade permanente - então recomendaria talvez duas grandes medidas:
1) o reforço das atividades de team building para toda a equipa, mas algo mais dirigido e enquadrado em objetivos específicos da organização. Com o teletrabalho, reforçaria a necessidade de aproveitar para passar a cultura da empresa e fazer com que as pessoas se conheçam pessoalmente;
2) aposta nas chefias imediatas das equipas, que é onde o desafio atualmente é maior. As equipas mais operacionais que estão em teletrabalho não têm tido grandes dificuldades em exercer seu papel, e em alguns casos até aumentaram a sua produtividade. Muito dos quadros de topo também se adaptaram bem, apesar de existirem muitos relatos de sobrecarga de horas de trabalho e sucessão de reuniões vídeo umas atrás das outras. Mas quem tem tido maior dificuldade de adaptação têm sido muitas vezes as chefias imediatas e alguns cargos mais especializados. Nestes casos, recomendaria que as chefias imediatas tivessem formação específica para lidar com as equipas à distância. Aqui o truque principal é encontrar novos formatos e canais de comunicação com a equipa.. Aquilo que se perdeu com o fim da comunicação informal de escritório, tem que ser compensado por uma comunicação mais efetiva e permanente da chefia direta. Formatos que ultrapassem o convencional. A chefia imediata tem um papel absolutamente crucial, para fazer com que as pessoas comuniquem, se conheçam melhor e interajam.
Entrevista para a newsletter Plataforma Legal 03-04/2021
Imagem: freepik / pessoas
Bem, esta pergunta só por si daria para escrever uma verdadeira enciclopédia. Para simplificar diria que, numa primeira fase, empresas e clientes se aproximaram num movimento “estamos todos no mesmo barco”. As pessoas ficaram muito mais compreensivas até na sua relação com as empresas perante a dificuldade de entrega a que estavam habituados, porque todos foram colocadas em situações que não eram habituais e, portanto, acabaram por compreender que as próprias empresas tivessem tido alguma dificuldade no início, a adaptar-se a esta nova realidade do teletrabalho. No entanto, com o passar do tempo e à medida que muitas empresas mantinham a dificuldade em adaptarse aos novos tempos, a tolerância dos consumidores foi diminuindo. Diria que alguns meses após o início da pandemia, e hoje em dia, a exigência está ao nível do que era antigamente e muitas empresas continuam a não ter toda a capacidade de resposta a que os seus clientes estavam habituados. O que temos hoje em dia é uma sociedade ainda mais dependente da tecnologia, muito menos dependente do presencial - algo que pelo menos em parte se vai manter. E, portanto, a relação das pessoas com as suas empresas é muito mais tecnológica do que era. Nesse sentido é uma relação que implica cada vez mais respostas imediatas e claras. As pessoas não querem perder muito tempo a fazer aquilo que podem fazer com dois ou três cliques no telemóvel e as empresas têm que dar resposta a essa exigência.
As reuniões por plataformas informáticas, em detrimento das reuniões presenciais, vieram para ficar?
Parcialmente. Acredito que muitas reuniões vão passar a existir apenas em formato remoto - por exemplo reuniões que antigamente obrigavam a deslocações de avião ou por exemplo no caso português, as muito concorridas viagens Lisboa/Porto. Muitas destas deixarão de se fazer da mesma forma porque todos percebemos que há reuniões que se conseguem substituir por uma videoconferência. Mesmo que não tenham exatamente os mesmos resultados, os ganhos que se conseguem a nível de tempo e custos, compensam alguma eventual perda de eficácia. No entanto, a componente humana vai continuar a ser importante. Não é por acaso que hoje em dia muitos de nós ansiamos por retomar, por exemplo, os almoços de trabalho. Para conhecer um cliente novo ou em momentos importantes para as empresas, o presencial vai voltar a ser dominante. Momentos de networking, como as conferências setoriais, formação de executivos, entre outras, voltarão pelo menos em parte a ser presenciais, porque o networking é completamente diferente, presencialmente. O presencial continua a ser apesar de tudo o método preferencial de contato com as pessoas e para fazer com que a nossa mensagem passe.
O teletrabalho será o futuro?
Para muitas empresas e profissionais o teletrabalho será o futuro e para muitos outros o modelo anterior vai regressar. Ainda não é possível cortar o cabelo virtualmente, por exemplo. No entanto, acredito que em boa parte das situações o teletrabalho vai pelo menos ser adotado parcialmente. Tem inúmeras vantagens quer para os trabalhadores quer para as empresas. No fundo permite de alguma forma racionalizar o uso das instalações das empresas, reduzindo custos que as empresas têm com o aluguer/aquisição e gestão dessas instalações. Para os trabalhadores há ganhos a nível de tempo e de liberdade de usufruto da sua vida pessoal, algo que a ida para o escritório compromete. Teremos um equilíbrio que não existia anteriormente entre a vida profissional e a pessoal feito caso a caso, empresa a empresa, indústria a indústria.
Como podem as empresas manter o controlo operativo e de qualidade estando os seus Colaboradores em teletrabalho?
Existem ramos de atividade em que o controle tem que ser feito pessoalmente. Mas na maior parte dos casos, isso não é necessário. Todo o trabalho que é feito na área dos serviços de forma remota, também consegue ser controlado remotamente. Se é possível fazer o trabalho em casa e o resultado depois é disponibilizado de alguma forma, então também é perfeitamente possível controlar a qualidade desse trabalho de forma remota. Em algumas situações é preciso alguma criatividade e em muitas outras é necessário quebrar com rotinas de trabalho enraizadas na pré-pandemia e que nunca voltarão tal como eram.
Como manter e promover o espírito de equipa e a integração nos valores da empresa, estando os colaboradores em teletrabalho?
Bem, há aqui um primeiro desafio que tem a ver com a integração dos colaboradores. O momento da integração dos colaboradores tem vindo a ser profundamente alterado pelo teletrabalho. Se estamos a falar de um trabalhador que já está na empresa há algum tempo, o teletrabalho acaba por não me ter um impacto muito significativo na questão da ligação à empresa porque essa cultura da empresa já existe e a ligação a colegas, chefias, etc. também. Quando estamos a falar de um colaborador que acabou de entrar na empresa e é imediatamente colocado em teletrabalho, há aqui de facto uma quebra no conhecimento da cultura da empresa e suas práticas que é mais difícil de compensar. Aqueles pequenos momentos na relação uns com os outros e aquela comunicação mais informal que existe presencialmente não se reproduz através do Zoom. Para minorar este impacto, diria que o primeiro a fazer é ter imensa atenção na integração inicial dos colaboradores na empresa, sendo transformados completamente através do envolvimento do maior número possível de pessoas nesse processo, incluindo as pessoas ao mais alto nível na organização. A cultura da empresa e a sua visão e missão serão melhor transmitidos pela Administração do que pelo colega do lado. Acrescentaria também o reforço de algum tipo de mentoria, que não deve ser pelo chefe direto (apenas). É completamente diferente ser o chefe a fazer o acompanhamento de uma pessoa que entra, do que ser um colega de trabalho mais experiente. Ou ser uma pessoa mais sénior na empresa, que até pode estar noutra área completamente diferente, mas que vai ter uma dedicação especial no enquadramento deste colaborador. Aqui é fundamental ter alguém que verdadeiramente vista a camisola da Empresa, mas saiba também ser pedagógico e crie empatia com o novo colaborador. Para todos os restantes colaboradores - até porque há o risco de esta ligação com a empresa se ir desvanecendo com o tempo se o teletrabalho passar a ser uma realidade permanente - então recomendaria talvez duas grandes medidas:
1) o reforço das atividades de team building para toda a equipa, mas algo mais dirigido e enquadrado em objetivos específicos da organização. Com o teletrabalho, reforçaria a necessidade de aproveitar para passar a cultura da empresa e fazer com que as pessoas se conheçam pessoalmente;
2) aposta nas chefias imediatas das equipas, que é onde o desafio atualmente é maior. As equipas mais operacionais que estão em teletrabalho não têm tido grandes dificuldades em exercer seu papel, e em alguns casos até aumentaram a sua produtividade. Muito dos quadros de topo também se adaptaram bem, apesar de existirem muitos relatos de sobrecarga de horas de trabalho e sucessão de reuniões vídeo umas atrás das outras. Mas quem tem tido maior dificuldade de adaptação têm sido muitas vezes as chefias imediatas e alguns cargos mais especializados. Nestes casos, recomendaria que as chefias imediatas tivessem formação específica para lidar com as equipas à distância. Aqui o truque principal é encontrar novos formatos e canais de comunicação com a equipa.. Aquilo que se perdeu com o fim da comunicação informal de escritório, tem que ser compensado por uma comunicação mais efetiva e permanente da chefia direta. Formatos que ultrapassem o convencional. A chefia imediata tem um papel absolutamente crucial, para fazer com que as pessoas comuniquem, se conheçam melhor e interajam.
Entrevista para a newsletter Plataforma Legal 03-04/2021
Imagem: freepik / pessoas